Espaço reservado à reflexão sobre questões que nos incomodam e nem sempre tivemos com quem nos aconselhar. Reflete a opinião de quem, embora não seja dono da verdade, se esforça por ser um servo fiel dela. Existe algo que sempre o incomodou e que ainda não encontrou resposta satisfatória? Este é o seu espaço, você poderá perguntar o que quiser e eu lhe direi o que penso, embasado na Bíblia Sagrada. Trazer-lhe a Palavra de Deus e tirar a sua dúvida, ajudando-o (a) a refletir acerca de seu dia-a-dia é o que mais desejo. Você pode usar o espaço "comentários" para enviar suas perguntas ou, se preferir, mande-as via e-mail: pr.sandromarcio@hotmail.com e aguarde a publicação da resposta no blog.
Que Deus nos ajude!

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Por que Jesus deixou Judas Iscariotes Participar da Ceia?


Em 13 de setembro de 2011, o Pr. Durval perguntou:

Irmão uma coisa que muito me intriga e que não sei se terei resposta aqui, é: Por que Jesus Permitiu que Judas Iscariotes tomasse a Santa Ceia?

Caro Pr. Durval,
De fato é intrigante que o Nosso Senhor tenha permitido que um traidor estivesse com ele à mesa, justamente na Santa Ceia, um momento de necessária contrição e consagração. Isto pode até nos levar a pensar: “ora, se Judas Iscariotes pode, então, todo mundo pode participar da Santa Ceia!”.

Contudo, vejamos se é de fato assim.

Lucas 22.
15  E disse-lhes: Tenho desejado ansiosamente comer convosco esta Páscoa, antes do meu sofrimento.
16  Pois vos digo que nunca mais a comerei, até que ela se cumpra no reino de Deus.
17  E, tomando um cálice, havendo dado graças, disse: Recebei e reparti entre vós;
18  pois vos digo que, de agora em diante, não mais beberei do fruto da videira, até que venha o reino de Deus.
19  E, tomando um pão, tendo dado graças, o partiu e lhes deu, dizendo: Isto é o meu corpo oferecido por vós; fazei isto em memória de mim.
20  Semelhantemente, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este é o cálice da nova aliança no meu sangue derramado em favor de vós.
21  Todavia, a mão do traidor está comigo à mesa.
22  Porque o Filho do Homem, na verdade, vai segundo o que está determinado, mas ai daquele por intermédio de quem ele está sendo traído!
23  Então, começaram a indagar entre si quem seria, dentre eles, o que estava para fazer isto.

João 13.
18  Não falo a respeito de todos vós, pois eu conheço aqueles que escolhi; é, antes, para que se cumpra a Escritura: Aquele que come do meu pão levantou contra mim seu calcanhar.
19  Desde já vos digo, antes que aconteça, para que, quando acontecer, creiais que EU SOU.
20  Em verdade, em verdade vos digo: quem recebe aquele que eu enviar, a mim me recebe; e quem me recebe recebe aquele que me enviou.
21  Ditas estas coisas, angustiou-se Jesus em espírito e afirmou: Em verdade, em verdade vos digo que um dentre vós me trairá.
22  Então, os discípulos olharam uns para os outros, sem saber a quem ele se referia.
23  Ora, ali estava conchegado a Jesus um dos seus discípulos, aquele a quem ele amava;
24  a esse fez Simão Pedro sinal, dizendo-lhe: Pergunta a quem ele se refere.
25  Então, aquele discípulo, reclinando-se sobre o peito de Jesus, perguntou-lhe: Senhor, quem é?
26  Respondeu Jesus: É aquele a quem eu der o pedaço de pão molhado. Tomou, pois, um pedaço de pão e, tendo-o molhado, deu-o a Judas, filho de Simão Iscariotes.
27  E, após o bocado, imediatamente, entrou nele Satanás. Então, disse Jesus: O que pretendes fazer, faze-o depressa.

Como vimos nestes textos, Judas Iscariotes participou sim da Santa Ceia!

Então assim como Judas Iscariotes, todos podem participar da Ceia do Senhor?


Não! Vamos com calma! É importante que se diga que, embora isto tenha acontecido com o conhecimento e o consentimento do Senhor; todavia, ocorreu sem que os demais discípulos houvessem entendido que ele seria o traidor, mesmo que Jesus os tenha alertado.

Devemos nos lembrar que a traição de Judas ainda não havia se consumado, e só Jesus podia saber com certeza, pois Cristo é o Deus Filho!

Algo assim pode ocorrer em nossos dias, de alguém tomar a Santa Ceia de forma indigna, sem que a Igreja saiba de seu pecado.

Para evitar isto o apóstolo Paulo escreveu, ensinando sobre a Ceia e apelando para a consciência de cada um:

23 Porque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão;
24  e, tendo dado graças, o partiu e disse: Isto é o meu corpo, que é dado por vós; fazei isto em memória de mim.
25  Por semelhante modo, depois de haver ceado, tomou também o cálice, dizendo: Este cálice é a nova aliança no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em memória de mim.
26  Porque, todas as vezes que comerdes este pão e beberdes o cálice, anunciais a morte do Senhor, até que ele venha.
27  Por isso, aquele que comer o pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente, será réu do corpo e do sangue do Senhor.
28  Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e, assim, coma do pão, e beba do cálice;
29  pois quem come e bebe sem discernir o corpo, come e bebe juízo para si.
30  Eis a razão por que há entre vós muitos fracos e doentes e não poucos que dormem.
31  Porque, se nos julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados.
32  Mas, quando julgados, somos disciplinados pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo.

Perceba a relação que há entre a Santa Ceia e a traição de Judas (na noite em que foi traído), demonstrada nas expressões “aquele que comer ou beber o cálice do Senhor indignamente é réu do corpo e do sangue do Senhor” e  “quem come e bebe sem discernir o corpo, come e bebe juízo para si”. Sim, todo aquele que conhecendo o Senhor, deliberadamente vive em pecado, não se importando sequer com a consagração exigidas especialmente na Santa Ceia, age como um Judas, trai o Senhor que morreu para salvar os pecadores!
Veja bem, embora isto seja assim, não deve ser encarado como motivo para o crente abandonar a prática do sacramento e sim para abandonar o pecado que o impede de tomá-lo. Pois, como preceitua a nossa Confissão de Fé de Westminster, em seu capítulo XXII, acerca do sacramento da Santa Ceia:

VIII. Ainda que os ignorantes e os ímpios recebam os elementos visíveis deste sacramento, não
recebem a coisa por eles significada, mas, pela sua indigna participação, tornam-se réus do corpo e
do sangue do Senhor para a sua própria condenação; portanto eles como são indignos de gozar
comunhão com o Senhor, são também indignos da sua mesa, e não podem, sem grande pecado
contra Cristo, participar destes santos mistérios nem a eles ser admitidos, enquanto permanecerem
nesse estado.
Ref. I Cor. 11:27, 29, e 10:21; II Cor. 6:14-16; I Cor. 5:6-7, 13; II Tess. 3:6, 14-15; Mat. 7:6.


Entendemos que Paulo apela à consciência do crente naquilo em que apenas ele ou poucos sabem sobre seu pecado para que NÃO TOME A CEIA INDIGNAMENTE. Contudo, quando este pecado é do conhecimento da igreja e passível de disciplina eclesiástica, cabe aos pastores e presbíteros afastar o irmão rebelde, para que não tome a louca atitude de ofender a Cristo com sua participação na Ceia, sem ter a sua vida restaurada segundo a Palavra de Deus!

Confira: 

2 Coríntios 2.
5  Ora, se alguém causou tristeza, não o fez apenas a mim, mas, para que eu não seja demasiadamente áspero, digo que em parte a todos vós;
6  basta-lhe a punição pela maioria.

1 Timóteo 5.
20  Quanto aos que vivem no pecado, repreende-os na presença de todos, para que também os demais temam.

Tito 3.
10  Evita o homem faccioso, depois de admoestá-lo primeira e segunda vez,
11  pois sabes que tal pessoa está pervertida, e vive pecando, e por si mesma está condenada.

Romanos 16.
17 ¶ Rogo-vos, irmãos, que noteis bem aqueles que provocam divisões e escândalos, em desacordo com a doutrina que aprendestes; afastai-vos deles,
18  porque esses tais não servem a Cristo, nosso Senhor, e sim a seu próprio ventre; e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o coração dos incautos.

2 João 9.
9  Todo aquele que ultrapassa a doutrina de Cristo e nela não permanece não tem Deus; o que permanece na doutrina, esse tem tanto o Pai como o Filho.
10 Se alguém vem ter convosco e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem lhe deis as boas-vindas.
11  Porquanto aquele que lhe dá boas-vindas faz-se cúmplice das suas obras más.

Na história da Igreja Cristã, temos o exemplo do apóstolo João, contado por seu discípulo Policarpo por volta de 130 dC e preservado por Irineu, que demonstra o zelo do apóstolo em sair às pressas de um banheiro público, para evitar a companhia de Cerinto, o herege.  

Assim, respondo à pergunta reconhecendo que não podemos afirmar, sem sombra de dúvidas, o que pensava o Nosso Senhor ao permitir a participação de Judas Iscariotes na Santa Ceia, mas inferir que serviu ele de modelo a tantos quantos mantém uma vida secreta de pecados, mesmo dentro da Igreja, participando dos cultos e dos sacramentos do Batismo e da Santa Ceia, alertando para o triste fim reservado para tal proceder.

E isto, de modo algum, excetua a liderança da Igreja de zelar pela fidelidade, pureza e ordem da Casa e do povo de Deus, mediante os meios e processos adequados à Escritura Sagrada!

Em Cristo,

Pr, Sandro Márcio

PS. Para melhor compreensão da Disciplina Eclesiástica na Igreja Presbiteriana do Brasil, insiro aqui os três primeiros capítulos de nosso Código de Disciplina:

CÓDIGO DE DISCIPLINA - CAPÍTULO I - NATUREZA E FINALIDADE - Art.1º - A Igreja reconhece o foro íntimo da consciência, que escapa à sua jurisdição, e da qual só Deus é Juiz; mas reconhece também o foro externo que está sujeito à sua vigilância e observação. Art.2º - Disciplina eclesiástica é o exercício da jurisdição espiritual da Igreja sobre seus membros, aplicada de acordo com a Palavra de Deus.
Parágrafo Único - Toda disciplina visa edificar o povo de Deus, corrigir escândalos, erros ou faltas, promover a honra de Deus, a glória de Nosso Senhor Jesus Cristo e o próprio bem dos culpados. Art.3º - Os membros não-comungantes e outros menores, sob a guarda de pessoas crentes, recebem os cuidados espirituais da Igreja, mas ficam sob a responsabilidade direta e imediata das referidas pessoas, que devem zelar por sua vida física, intelectual, moral e espiritual.
CAPÍTULO II - FALTAS - Art.4º - Falta é tudo que, na doutrina e prática dos membros e concílios da Igreja, não esteja de conformidade com os ensinos da Sagrada Escritura, ou transgrida e prejudique a paz, a unidade, a pureza, a ordem e a boa administração da comunidade cristã. Parágrafo Único - Nenhum tribunal eclesiástico poderá considerar como falta, ou admitir como matéria de acusação aquilo que não possa ser provado como tal pela Escritura, segundo a interpretação dos Símbolos da Igreja (Cons., Art.1º). Art.5º - A omissão dos deveres constantes do Art.3º constitui falta passível de pena. Art.6º - As faltas são de ação ou de omissão, isto é, a prática de atos pecaminosos ou a abstenção de deveres cristãos; ou, ainda, a situação ilícita. Parágrafo Único - As faltas são pessoais se atingem a indivíduos; gerais, se atingem a coletividade; públicas, se fazem notórias; veladas quando desconhecidas da comunidade. Art.7º - Os concílios incidem em falta quando: a) tomam qualquer decisão doutrinária ou constitucional que flagrantemente aberra dos princípios fundamentais adotados pela Igreja; b) procedem com evidente injustiça, desrespeitando disposição processual de importância, ou aplicando pena em manifesta desproporção com a falta; c) são deliberadamente contumazes, na desobediência às observações que, sem caráter disciplinar, o Concílio superior fizer no exame periódico do livro de atas; d) se tornam dessidiosos no cumprimento de seus deveres, comprometendo o prestígio da Igreja ou a boa ordem do trabalho; e) adotam qualquer medida comprometedora da paz, unidade, pureza e progresso da Igreja.
CAPÍTULO III - PENALIDADES - Art.8º - Não haverá pena, sem que haja sentença eclesiástica, proferida por um Concílio competente, após processo regular. Art.9º - Os Concílios só podem aplicar a pena de:
a) Admoestação, que consiste em chamar à ordem o culpado, verbalmente ou por escrito, de modo reservado, exortando-o a corrigir-se; b) Afastamento, que em referência aos membros da Igreja, consiste em serem impedidos de comunhão; em referência, porém, aos oficiais consiste em serem impedidos do exercício do seu ofício e, se for o caso, da comunhão da Igreja. O afastamento deve dar-se quando o crédito da religião, a honra de Cristo e o bem do faltoso o exigem, mesmo depois de ter dado satisfação ao tribunal. Aplica-se por tempo indeterminado, até o faltoso dar prova do seu arrependimento, ou até que a sua conduta mostre a necessidade de lhe ser imposta outra pena mais severa; c) Exclusão, que consiste em eliminar o faltoso da comunhão da Igreja. Esta pena só pode ser imposta quando o faltoso se mostra incorrigível e contumaz;
d) Deposição é a destituição de ministro, presbítero ou diácono de seu ofício. Art.10 - Os Concílios superiores só podem aplicar aos inferiores as seguintes penas: repreensão, interdição e dissolução; a) Repreensão é a reprovação formal de faltas ou irregularidades com ordem terminante de serem corrigidas; b) Interdição é a pena que determina a privação temporária das atividades do Concílio; c) Dissolução é a pena que extingue o Concílio. § 1º - No caso de interdição ou disso interdição ou dissolução do Conselho ou Presbitério deverá haver recurso de ofício para o Concílio imediatamente superior. § 2º - As penas aplicadas a um Concílio não atingem individualmente seus membros, cuja responsabilidade pessoal poderá ser apurada pelos Concílios competentes. § 3º - É facultado a qualquer dos membros do Concílio interditado ou dissolvido recorrer da decisão para o Concílio imediatamente superior àquele que proferiu a sentença. Art.11 - Aplicadas as penas previstas nas alíneas “b” e “c” do Artigo anterior, o Concílio superior, por sua Comissão Executiva, tomará as necessárias providências para o prosseguimento dos trabalhos afetos ao Concílio disciplinado. Art.12 – No julgamento dos Concílios, devem ser observadas no que lhes for aplicável, as disposições gerais do processo adotadas nesta Constituição. Art.13 - As penas devem ser proporcionais às faltas, atendendo-se, não obstante, às circunstâncias atenuantes e agravantes, a juízo do tribunal, bem como à graduação estabelecida nos Artigos 9 e 10. § 1º - São atenuantes: a) pouca experiência religiosa; b) relativa ignorância das doutrinas evangélicas; c) influência do meio; d) bom comportamento anterior; e) assiduidade nos serviços divinos; f) colaboração nas atividades da Igreja; g) humildade; h) desejo manifesto de corrigir-se; i) ausência de más intenções; j) confissão voluntária. § 2º - São agravantes: a) experiência religiosa; b) relativo conhecimento das doutrinas evangélicas; c) boa influência do meio; d) maus precedentes; e) ausência aos cultos; f) arrogância e desobediência; g) não reconhecimento da falta. Art.14 - Os Concílios devem dar ciência aos culpados das penas impostas: a) Por faltas veladas, perante o tribunal ou em particular; b) Por faltas públicas, casos em que, além da ciência pessoal, dar-se-á conhecimento à Igreja. Parágrafo Único - No caso de disciplina de ministro dar-se-á, também, imediata ciência da pena à Secretaria Executiva do Supremo
Concílio. Art.15 - Toda e qualquer pena deve ser aplicada com prudência, discrição e caridade, a fim de despertar arrependimento no culpado e simpatia da Igreja. Art.16 - Nenhuma sentença será proferida sem que tenha sido assegurado ao acusado o direito de defender-se. Parágrafo Único - Quando forem graves e notórios os fatos articulados contra o acusado, poderá ele, preventivamente, a juízo do tribunal, ser afastado dos privilégios da Igreja e, tratando-se de oficial, também do exercício do cargo, até que se apure definitivamente a verdade. Art.17 - Só se poderá instaurar processo dentro do período de um ano a contar da ciência da falta. Parágrafo Único - Após dois anos da ocorrência da falta, em hipótese alguma se instaurará processo.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Por que batizamos nossas crianças?


O Pb. Carlos Alberto solicitou:
Caro Pr. Sandro, discorra sobre a validade do batismo infantil!

Amado irmão e Pb. Carlos, de forma breve vou pontuar acerca do fundamento bíblico e teológico para batizarmos os filhos dos crentes.


“Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século”. Mateus 28. 18-20
“Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente”. I Tm 5:8

Para que entendamos o batismo cristão, e o batismo infantil como sua expressão legítima, não podemos perder de vista o seu verdadeiro significado; pois, como dizia o Rev. João Calvino:  “Em primeiro lugar, é doutrina em que todos os fiéis estão de acordo, que  a devida consideração dos sinais ou sacramentos que o Senhor instituiu em sua Igreja, não consiste somente no exterior nem nas cerimônias visíveis, senão que principalmente depende das promessas e mistérios espirituais que o Senhor quis representar  com tais cerimônias. Deste modo, aquele que quiser saber o significado do batismo e a que fim está destinado, não deve deter-se meramente na água e nas cerimônias exteriores, mas deve considerar às promessas de Deus , que se nos fazem no Batismo, e as realidades espirituais que nele se nos representam. Se chegarmos a isto teremos a verdadeira substância e verdade do Batismo; e assim teremos a compreensão do fim para o qual tem sido ordenada a aspersão da água que é feita no Batismo, e para que isto nos serve. Se, todavia, não tivermos isto presente, e nosso entendimento se detém exclusiva e unicamente no que exteriormente se executa, jamais compreenderemos sua virtude, nem quão importante coisa é o batismo, nem o que significa a água, e nem mesmo qual é o seu uso.”.
            Deste modo, o batismo é o sinal e a confirmação da entrada do indivíduo na Igreja, como comunidade da aliança com Deus. O batismo com água representa a nossa inserção ao povo do pacto; assim como foi com a circuncisão no antigo Israel, é agora com o batismo no Novo Israel de Deus, a Igreja Cristã; e isto está em perfeita sintonia com o pastor Zuínglio, quando dizia que “o batismo infantil  era um fato essencialmente eclesiástico”.  Com o batismo, assumimos os menores, filhos dos crentes (e crianças em sua guarda) como crentes também. Damos-lhes a educação e o tratamento de legítimos membros da família da aliança, ensinando-lhes as verdades e as responsabilidades do verdadeiro compromisso com Deus; enquanto rogamos a Deus que, por sua obra interna, produza neles os frutos de uma nova vida, que serão visíveis na idade da razão, e posteriormente confirmados em sua pública profissão de fé. Graças ao bom Deus inúmeras vezes temos colhido semelhantes resultados. E quando não ocorre a profissão de fé do adulto que foi batizado na infância, é este automaticamente excluído do rol de membros menores, devendo ser acompanhado de perto pela igreja, com as orações de que a semente plantada na infância venha um dia, finalmente a florescer.
Para aqueles que exigem um texto bíblico que ordene explicitamente o batismo infantil, devolvemos a obrigação de apresentar o fundamento que os crentes atuais têm para não contemplar as crianças como corpo de Cristo; será que apenas a Antiga Aliança é que prezava os pequeninos como parte integrante do povo de Deus?
Todavia, alguns objetam citando Marcos 16.15. “Quem crer e for batizado será salvo”, dizendo que sem fé não pode haver batismo; mas esquecem que este texto nem de longe tenta tratar acerca do batismo infantil, seja condenando-o ou ratificando-o. Pois, se este fosse o caso, como trataríamos o final: “e quem não crer será condenado”? A criança que ainda não pode crer está condenada? Creio que semelhante sentença só poderia ser dada pelo Senhor Jesus; mas ele, muito ao contrário, ao se referir às crianças que eram levadas pelos pais crentes à sua presença disse: “dos tais é o reino dos céus” (Lc. 18.16). Todavia este mesmo texto é citado pelos anti-pedobatistas, como que a perguntar: se as crianças devem ser batizadas, não seria aquele o melhor momento de fazê-lo? Por que não se diz que Jesus as tenha batizado, apenas que elas foram apresentadas a Jesus, como é feito na igrejas batistas de todo o mundo. Entretanto, mais uma vez, o silêncio não serve nem para provar que aquelas crianças foram e nem para dizer que não foram anteriormente batizadas juntamente com seus pais; contudo, despreza-se um ponto importantíssimo do texto, pois,  Jesus disse daquelas crianças que elas já possuíam a cidadania do reino de Deus, e como o batismo com água é apenas a representação visível desta realidade, e tendo elas a realidade garantida por Jesus, a figura, que é elemento secundário diante da realidade, não lhes pode ser negada.
E, quanto à fé, como elemento instrumental da salvação, podemos dizer que em muitos pontos da Escritura encontramos a inserção das crianças, antes mesmo que pudessem crer, vemos que a ação de Deus antecipa-se e ocasiona a resposta positiva do homem, de tal modo que pela soberania divina, até mesmo crianças ainda não nascidas já são dadas como regeneradas, como foi o caso de João Batista, que era cheio do Espírito Santo desde o ventre materno, e de lá já se regozijava com a proximidade do Filho de Deus (cf. Lc. 3). Este foi também o caso de Sansão e Samuel, que, como nazireus de Deus, foram especialmente dedicados ao Senhor por seus pais, desde o ventre materno, para não apenas serem tomados pelo Espírito Santo para uma obra, e sim para todo o desenrolar de sua vida, onde, a despeito de suas falhas e pecados, completaram brilhantemente a obra à qual foram chamados. Alguém pode replicar que foram casos especiais; e de fato, foram casos especiais como Isaque, Moisés, Davi, Jeremias, Timóteo e tantos outros, do Antigo e do Novo Testamento, dos quais a Bíblia nada fala de conversão, e reconhecemos que eles carregaram em sua carne e honraram o sinal do compromisso de sua família com Deus, pois eram de fato e de verdade filhos de Abraão. Embora não possamos dizer que isso se dê com todas as crianças, e nem mesmo com todos os filhos de crentes, mas demonstramos que não há impedimento algum de Deus regenerar e salvar aqueles a quem quer, mesmo que estejam ainda impossibilitados de entender ou de exercer fé. É, realmente, uma grande bênção, e um favor especial da parte de Deus, manifestar-se graciosamente aos filhos de seus filhos, e quão terno e sublime é ouvir o nosso filhinho dizer suas primeiras palavras e suas primeiras orações.
Não se trata de afirmar aqui, como querem alguns, que todo o filho de crente tem a sua salvação garantida. E, infelizmente há os que citam Atos 2.39, como se tal coisa fosse promessa de Deus; mas vejamos:
“Pois para vós outros é a promessa, para vossos filhos e para todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor, nosso Deus, chamar”.
É evidente aqui o compromisso de Deus com as futuras gerações, inclusive com o vasto números de crentes que o Senhor suscita nos lares cristãos, mas ainda fica saliente o fato de que Deus se reserva o direito de chamar quem lhe apraz, pois, do contrário, seríamos levados a defender a doutrina universalista, uma vez que todos descendemos do justo Noé; contudo, diz a Escritura:
“tão certo como eu vivo, diz o SENHOR Deus, ainda que Noé, Daniel e Jó estivessem no meio dela, não salvariam nem a seu filho nem a sua filha; pela sua justiça salvariam apenas a sua própria vida”. Ezequiel 14:20
Também não podemos esquecer de outros exemplos de filhos que até em seus últimos momentos contradisseram os ensinamentos de seus pais, como Absalão filho de Davi, que morreu tentando matar o pai (2 Sm. 15 - 18), e o idólatra e infanticida Acaz, filho de Jotão e neto de Uzias (2 Reis 16), entre outros; tipos aos quais bem se aplica a pregação de João Batista: “e não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão, pois eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão” (João 3.8). E não nos surpreendamos que acerca de muitos destes pode bem ter sido dirigida a exclamação do apóstolo João: “Eles saíram de nosso meio, mas não eram dos nossos; porque, se tivessem sido dos nossos teriam permanecido conosco; todavia eles se foram para que ficasse manifesto  que   nenhum deles eram dos nossos” (I João 2. 19). E isto não se observa apenas no passado, pois, com tristeza temos visto se cumprirem em alguns lares cristãos as palavras de  Jesus “...os inimigos do homem serão os da sua própria casa” (Mt. 10.36).
Mas então, o que dizer da promessa feita à posteridade de Abraão?
Leia com atenção:
 “E não pensemos que a palavra de Deus haja falhado, porque nem todos os de Israel são, de fato, israelitas;  nem por serem descendentes de Abraão são todos seus filhos; mas: Em Isaque será chamada a tua descendência”. Romanos 9:6, 7
E ainda:
“Essa é a razão por que provém da fé, para que seja segundo a graça, a fim de que seja firme a promessa para toda a descendência, não somente ao que está no regime da lei, mas também ao que é da fé que teve Abraão (porque Abraão é pai de todos nós” (Romanos 4:16).

Sejamos sinceros em reconhecer que a Igreja batiza aos adultos e administra a Ceia do Senhor, sem ter jamais a prova total de que os participantes são verdadeiros crentes. Ser circuncidado ou batizado não conferia e nem confere salvação a ninguém, seja aos antigos israelitas ou prosélitos, ou aos crentes modernos,  mas expõe diante de todos o compromisso de fé e obediência ao eterno e único Deus que salva.


Mas, se o batismo não assegura a salvação; então por que batizar?

Para que a Igreja visível seja coerente com sua missão de reconciliação do homem com Deus, a começar daqueles que o Senhor tem feito nascer em seu arraial, identificando-os, não como anjinhos, mas como pecadores diante de um Deus gracioso, que os chama para a fé e a obediência em Jesus, para que falemos como Josué: Eu e a minha casa serviremos ao Senhor! Ora, se não crermos no poder da palavra de Deus em nossos lares, com que ânimo a pregaremos ao mundo?
Assim, da relação direta entre circuncisão e batismo; da aliança eterna de Deus com seu povo e da confiança que isto nos inspira, num estudo sincero e dedicado da Palavra de Deus, podemos assegurar que toda criança nascida no seio da Igreja, carrega desde cedo o compromisso de servir e amar a Deus.
Não se trata de nenhum tipo de transmissão física da fé, mas da aplicação da regra geral expressa em Provérbios 22:6: “Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda quando for velho, não se desviará dele”.
Não temos certeza se todos os batizados são ou serão verdadeiros crentes, não temos conhecimento do coração de cada um, mas temos o dever de tratar a todos como membros legalmente inseridos na Igreja visível, sujeitos aos privilégios e obrigações decorrentes do pacto.
Os pais crentes, bem como toda a Igreja, são responsáveis por desenvolver e solidificar este entendimento na mente da criança. E, neste ponto temos visto um fragrante desrespeito à aliança, pois muitos pais tem relegado o ensino cristão à igreja, e há igrejas que não tem dado suficiente atenção ao departamento infantil, que em certos casos funciona como entretenimento aos pequenos, enquanto seus pais participam do culto no templo.
Nestes casos, tem havido um grande distanciamento entre pais e filhos, ao ponto de, em chegando a idade, estes últimos se “assustem” com o culto adulto, sua seriedade, seu compromisso, sua solenidade.
Não se trata aqui, em absoluto, de se lutar por um culto menos solene, mais agradável, pois julgo que este tem sido o caminhar de muitos em nossos dias, e que a ênfase ao lazer e ao sentir-se bem já tem ceifado muito do que em outros tempos nosso Senhor falou acerca do “negar-se a si mesmo” e de buscar a “glória de Deus”.
A isto se soma a falta do ensino da teologia da aliança aos filhos dos crentes; que, em muitos casos são “evangelizados” e convidados a aceitarem a Jesus, em completa  desconsideração ao compromisso que a criança crente já nutre com o Senhor Jesus, desde a mais tenra infância, como se reputasse em pouco ou nada o fato da Providência ter lhe dado um berço cristão. Tem-se falado acerca de “aceitar Jesus como seu salvador”, e pouco se têm dito do direito que o Senhor desde o seu nascimento tem sobre sua vida e os deveres que isto lhe acarreta.
Uma vez entendido o antigo rito  da circuncisão, e o batismo como seu correspondente neo-testamentário, vale lembrar que não se perguntava ao israelita se ele aceitava a Deus como seu Senhor, antes apontava-lhe as bênçãos do pacto e as maldições decorrentes de sua quebra. Do mesmo modo, devem os pais crentes ensinar seus filhos a amar e respeitar o seu Deus como o Deus deles, o seu Senhor como o Senhor deles.  “Ensina a criança no caminho em que deve andar”! Fiz questão de enfatizar, DEVE andar; para a criança é uma questão de dever antes que de uma escolha pessoal, ainda mais importante do que tomar banho, dormir na hora certa ou ir à escola é um compromisso da família cristã com Deus e a Sua Igreja!
Devem assim, os pais, além de trazerem fielmente os filhos ao batismo e aos trabalhos religiosos, lembrar-se que é no lar que a criança aprende aquela lição tão difícil chamada vida cristã, que reconhecerá, no modo como os pais a tratam, cuidam e corrigem; nos momentos de tensão; quando a necessidade parece ser bem maior que a possibilidade; quando o pastor e os irmãos da igreja não estiverem por perto.
Além disso, é o momento de a igreja, se ainda não fez, compreender que o batismo infantil é mais do que um pacto entre Deus, os pais e as crianças, é também um compromisso que a igreja assume de bem receber, cuidar, amparar e ensinar os pequeninos. É preciso considerar se estamos tornando o evangelho acessível às crianças, é preciso que elas aprendam a grande diferença que há entre as histórias bíblicas e verídicas da travessia do mar vermelho, da luta de Davi com Golias, dos milagres de Jesus, etc. e as tantas fábulas dos livros infantis. Lembremo-nos do famoso reformador Martinho Lutero que ensinava que o sermão não devia ser expresso em jargões teológicos, mas na linguagem clara e viva do povo: “ Não prego para os doutores Pomerano, Jonas e Filipe’, mas para os meus pequenos Hans e Elizabeth”.
Não pode ser que estejamos tão interessados em trazer os de fora que não vejamos como os nossos filhos necessitam desde cedo do evangelho. E nada, asseguro, nem jogos, nem festivais, nem atividades, poderão segurá-los legitimamente na igreja a não ser a correta compreensão da graça salvadora, revelada de maneira toda especial na família cristã.
Assim, deve-se facilitar à criança o entendimento que a igreja e a mensagem de Deus é tão sua quanto de seus pais.
Teve este trabalho a função primordial de esclarecer que nem todo o batizado é salvo, mas, até que se prove o contrário, devemos considerá-lo como tal, todavia, e antes de tudo, todo o nascido na comunidade da aliança deve ser batizado pois se encontra em relação pactual com Deus, sendo imbuído de todos os deveres e privilégios advindos da aliança. Assim, não é bom pai o crente, e nem bom crente o pai, que não vê em seu filho um discípulo de Cristo.
“Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século”. Mateus 28. 18-20
“Ora, se alguém não tem cuidado dos seus e especialmente dos da própria casa, tem negado a fé e é pior do que o descrente”. I Tm 5:8
Tudo isto deve ser entendido, ao trazermos nossos pequenos ao batismo, que é um sinal da aliança de Deus conosco e com nossa família, uma aliança para toda a Igreja e para toda a vida. Mas, caso uma voz persista em dizer que o batismo jamais pode causar ou garantir a salvação de alguém, quanto mais de recém nascidos, no intuito de torná-lo mera e dispensável cerimônia, devemos,  com veemência insistir que nada do que o Senhor tem ordenado pode ser considerado desprezível ou sem sentido, pois se Ele quis marcar como seus os infantes do Antigo e do Novo Israel, alegremo-nos e cumpramos o Seu bendito querer.